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Mc 4,35-41

35À tarde daquele dia, disse-lhes: Passemos para o outro lado.

36Deixando o povo, levaram-no consigo na barca, assim como ele estava. Outras embarcações o escoltavam.

37Nisto surgiu uma grande tormenta e lançava as ondas dentro da barca, de modo que ela já se enchia de água.

38Jesus achava-se na popa, dormindo sobre um travesseiro. Eles acordaram-no e disseram-lhe: Mestre, não te importa que pereçamos?

39E ele, despertando, repreendeu o vento e disse ao mar: Silêncio! Cala-te! E cessou o vento e seguiu-se grande bonança.

40Ele disse-lhes: Como sois medrosos! Ainda não tendes fé?

41Eles ficaram penetrados de grande temor e cochichavam entre si: Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem?


Homilia no XII Domingo do Tempo Comum

HOMILIA NO XII DOMINGO DO TEMPO COMUM

            Queridos irmãos e irmãs aqui presentes e que nos acompanham neste momento, celebramos o domingo, dia do Senhor. Neste tempo em que a palavra de Deus é uma grande resposta às nossas inquietações, às nossas aflições, às tempestades que enfrentamos na vida, estamos, infelizmente, lembrando de tantos que sofreram como consequência a morte pelo covid-19. Lembramos também dos familiares, dos amigos, que enlutados precisam encontrar consolo e conforto junto a uma comunidade cristã. E a palavra de Deus não só é uma resposta para o nosso tempo presente, mas de fato, manifesta-se como uma presença real de Jesus nas várias circunstâncias da vida.

Deste modo, quero convidá-los para que entremos no espírito desta liturgia da palavra, especialmente por meio do Santo Evangelho segundo São Marcos. Marcos, o primeiro Evangelista que escreveu a respeito de Jesus, tinha consigo uma pergunta a responder: quem é Jesus Cristo? E durante os 16 Capítulos, é o evangelho mais curto que temos, a resposta se constrói a partir dos ensinamentos que Jesus deixava para as multidões, especialmente para os seus discípulos.

Hoje, nos encontramos no capítulo 4 deste evangelho de São Marcos, depois do momento em que Jesus fala das parábolas e das condições do reino. O texto vem nos dizer que naquele dia, ao cair da tarde, Jesus diz aos seus discípulos: vamos para a outra margem. Assim, somos convidados a construir uma imagem muito preciosa, a partir do evangelho, de toda a liturgia da palavra.

            Jesus, neste cair da tarde, transparece a imagem de um ser humano com o seu cansaço, pois depois da labuta diária, dos trabalhos realizados, é comum experimentarmos cansaço físico. E, ao cair da tarde, Jesus indica os seus discípulos: é preciso ir para outra margem, pois estavam no mar da Galileia, conhecido como mar, mas é um grande lago, não contem água salgada, mas doce.

Sendo um grande lago, neste lugar muitas vezes Jesus procurou ensinar, e é possível a travessia de um lado para outro. Então, Jesus diz o seguinte: vamos para outra margem. Como se dissesse para os discípulos e para nós, discípulos no tempo atual, sempre existe possibilidade de vida junto à outra margem. Embora enfrentemos e tenhamos condições, muitas vezes pessoais, e até do ponto de vista também de pertença ao mundo a enfrentar, sempre haverá uma possibilidade de renovação, sempre terá outra margem.

            Mas, na concepção de São Marcos, a outra margem significa ir aos pagãos, pois do lado se encontravam as 10 cidades conhecidas, pertencentes à Decápole. Eram cidades que precisavam do anúncio profético de Jesus. Os pagãos e os povos que precisam abrir o coração a Jesus Cristo, e não só os israelitas.

Então, os discípulos despedem as multidões. Prestemos atenção ao que acontece: e levaram Jesus consigo. É como se o evangelista estivesse a dizer: os discípulos já tem uma certa aceitação de Jesus, não deixam Jesus de lado, colocam Jesus na barca com eles. Existiam outras barcas, mas Jesus foi na barca com os discípulos.

A imagem do mar para os israelitas é muito misteriosa, na verdade não é um povo conhecido por estar navegando sobre o mar. Existia um grande receio, um grande medo do que estava dentro do mar. Para o povo de Israel, o mar carregava em si condições do mal, então, se o maligno que ali habitava tem força, precisamos ter um cuidado com relação a ele.

            Interessante que, quando falamos a respeito do mar, da natureza que está ao nosso redor, nos lembramos um pouco do Livro de Jó, primeira leitura de hoje, que narra uma resposta de Deus a Jó e Deus se utiliza da condição da natureza que o cerca, do mar que tem em Deus seu senhorio, da terra que também Deus tem o seu poder. Mas, sobretudo, a resposta de Deus para Jó é para que ele se coloque na condição de criatura, na condição de reconhecer que há um Deus que domina sobre tudo.

            Na verdade, quando aprofundamos um pouco a história de Jó encontramos um homem muito justo, procurou ser temente a Deus durante toda a vida, e ele, na concepção da época, como era um homem justo e bom deveria receber também todos os bens materiais e também espirituais.

Ou seja, naquele tempo quem era pecador recebia o mal, quem era justo recebia o bem, percebamos que às vezes ainda temos essa concepção do Antigo Testamento, como se Deus pudesse dar o bem ou fazer o bem porque fazemos o bem, e não é assim. Jó, sendo justo também foi provado e os seus amigos ficavam a dizer: como é que pode alguém como Jó aceitar um Deus único e verdadeiro, um só Deus, se agora não tem mais família, perdeu a condição material, e não tem saúde física e, de repente, Jó começa a interrogar Deus dizendo: como posso continuar a crer e a temer a Deus. E Deus responde a Jó: Eu tenho o senhorio de tudo, também sobre a tempestade, sobre o mar, sobretudo você, que como criatura tem o seu lugar. Mas, o senhorio sobre tudo é único, é de Deus, é Ele que tem o poder de acalmar a tempestade, e até dividir o mar, e fazer com que aquele povo pudesse passar a pé enxuto no Mar Vermelho.

            Assim, voltamos agora para o evangelho, o mar  tantas vezes aparece na sagrada escritura junto com uma barca, que atravessa de um lado para outro. A barca é a imagem da Igreja, muitas vezes, a Igreja foi identificada desde o início como uma grande barca. O mundo é a travessia da Igreja, e a barca está, portanto, passando por este mundo. Mas nesta barca e nesta noite vem uma ventania muito forte, muito maior do que a ventania que é comum naquele mar.

Talvez alguns de vocês já fizeram a experiência de ir  para a Terra Santa e quem sabe até atravessar o mar de Tiberíades, quem fez isso sabe que o vento é muito forte. Contudo, à noite maior ainda era a ventania, as ondas se lançavam para dentro da barca, começam agitar a vida da Igreja e a barca começa a se encher, e o evangelista diz: Jesus estava ali, porque colocaram Jesus, aceitaram Jesus nesta barca.

Jesus estava dormindo sobre um travesseiro, mas, espera, alguém que foi colocado junto, e estava realizando o sinal, agora dorme no momento em que mais se precisa. Às vezes, ficamos a questionar Deus e Jesus Cristo quando em meio à tempestade pensamos que ele nos abandonou. Onde está Jesus, onde está Deus em meio a essa tempestade, essa pandemia que estamos vivendo?

            E Jesus estava lá, dormindo sobre um travesseiro. Acho preciosa a ideia de muitos exegetas e biblistas que chegam a dizer que, neste momento do evangelho São Marcos, está fazendo uma alusão ao momento crucial em que Jesus padecerá a morte, dizendo o seguinte: que o sono que Jesus agora estava nesta barca é o sono da morte que Ele experimentou no momento em que foi colocado no sepulcro.

Jesus também foi levado para o calvário e lá enfrentou a cruz e morreu, e padeceu a morte por três dias, depois ressuscitou. É esta alusão que Jesus também está junto, mas dormindo, claro, pelo cansaço físico, mas a interpretação é muito fidedigna para lembrar que, embora o Senhor tenha experimentado o sono da morte, não abandonou a humanidade.

            Partimos agora para o final, o texto é precioso hoje, ainda mais porque aparece diálogos importantes entre os discípulos e Jesus. Então os discípulos acordaram Jesus e disseram: “mestre estamos perecendo e tu não te importas?” Mestre, porque já reconhecem que Jesus é o Senhor, e quem é mestre é aquele que está indicando o caminho.

Olhem a pergunta audaciosa dos discípulos, parecida muito com a nossa: mas mestre, estamos parecendo nessa pandemia, tantas mortes, tantas situações, tantas outras doenças, e tu não te importas? Então Jesus se levantou e ordenou ao vento e ao mar. Quem tem poder sobre o mar e sobre o vento, só Deus, conforme escutamos um pouco do Livro de Jó, e Jesus então ordena com duas palavras: silêncio, cala-te. Jesus não dialoga com a ventania e com o mar, porque com o mal que está no mar, o maligno, não há diálogo a fazer, há simplesmente a própria palavra muito profunda do silêncio, cala-te, e o vento cessou, e houve uma grande calmaria.

            Jesus, com certeza, realiza este sinal, então, é hora de devolver a pergunta aos discípulos, na verdade devolve com duas perguntas, já que fizeram uma agora vão receber duas: por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé? Aparece o sentimento do medo, é o mesmo sentimento que os discípulos experimentaram quando viram o Mestre padecer a morte.

Lembram-se no domingo de Páscoa, aquele evangelho onde os discípulos estavam trancados, e com medo, porque não sabiam o que poderia acontecer com eles, é este mesmo medo, e Jesus então pergunta: porque sois tão medrosos? De fato, quando nos deixamos dominar por esse sentimento de medo perdemos até a fé. Ainda não tendes fé, eles estão com Jesus, reconhecendo como mestre, mas ainda não tem uma fé profunda.

Sentiram um grande medo, e entre eles há esta pergunta, a última entre os discípulos, que se fazem uns aos outros: quem é este a quem até o vento e o mar lhe obedecem? Só pode ser Deus, porque Deus tem o poder sobre o mar, sobre o vento, só Deus tem o poder de fazer com que aquela tempestade passe. Então, os discípulos fazem esta pergunta entre si porque querem saber quem é Jesus, e o evangelho de São Marcos foi escrito para responder a esta pergunta: então quem é Jesus? É o filho de Deus.

            Se na primeira parte do evangelho transparece o rosto cansado de Jesus, que é um rosto humano, no final do Evangelho transparece o rosto Divino de Jesus. Tornou-se humano como nós, mas também tinha a sua divindade, é o próprio Deus, então transparece, quem é Jesus? Marcos vai responder no momento da Cruz, no final do Evangelho: verdadeiramente, ele é Filho de Deus.

Catequeticamente compreendemos que Jesus está sempre conosco em meio às tempestades da vida, mas precisaríamos aprender a dar graças por tudo que o Senhor nos concede.

            Permitam-me deixar uma lição para casa, para semana quem sabe, meditem o Salmo 106, parte da nossa liturgia de hoje.  Rezamos algumas partes, que também fala de tempestade, de bonança, do momento de alegria. É preciso dar graças a Deus pelo amor dele para conosco, pelas maravilhas que Ele nos concede, e embora estejamos numa tempestade tão grande, não esqueçamos, Jesus está sempre conosco.

Ele não nos abandona, Ele só pede que daquele sentimento de medo possamos experimentar um sentimento de alegria, porque pertencemos a Ele, e quem pertence a Cristo não tem o que temer.

São Paulo diz na Carta aos Coríntios: se alguém está em Cristo é uma criatura nova, o mundo velho desapareceu, tudo agora é novo. Se estamos com o Senhor, não tenhamos receio. Ele sempre estará conosco, como seus discípulos tenhamos a certeza: estamos seguindo para um caminho, um caminho de salvação. Se ele nos escolheu, se escolhemos por Ele, com certeza, este caminho, este itinerário será sempre bem vivenciado, graças às condições de um ser humano que reconhece um Deus que jamais falha.

Terminemos recorrendo a Maria Santíssima, que ela também interceda por nós, pelas famílias enlutadas, por aqueles que perderam a fé, e para que assim possamos progredir no caminho da salvação.

Escrito por: Pe. Maurício